Thesis
Trocas afetivo-sexuais e econômicas e AIDS na fronteira entre Angola e Namíbia
Sexual-affective and economic exchanges and AIDS on the border of Angola and Namibia
Registro en:
PINHO, Adriana de Araujo. Trocas afetivo-sexuais e econômicas e AIDS na fronteira entre Angola e Namíbia. 2012. 332 f. Tese (Epidemiologia em Saúde Pública) - Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2012.
Autor
Pinho, Adriana de Araujo
Resumen
Na África Subsaariana, o engajamento de mulheres jovens em relacionamentos com vários parceiros em busca de benefícios materiais /financeiros, denominado de sexo transacional temocupado um lugar de destaque para explicar a dinâmica da epidemia de HIV na região. Porém, os estudos esbarram em dificuldades conceituais e operacionais para delimitar e identificar tais práticas e analisá-las, em sua relação com o HIV/AIDS, desde uma perspectiva que contemple tanto aspectos macro-estruturais do contexto de vida das mulheres quanto aqueles de natureza micro-social observados na formação e manutenção de suas redes afetivo-sexuais. A partir de um estudo epidemiológico associado a um componente qualitativo de investigação, buscou-se com esta tese compreender a dinâmica dos relacionamentos afetivo-sexuais envolvendo trocas econômicas em uma região de fronteira internacional entre Angola e Namíbia e se e como poderiam influenciar a vulnerabilidade de jovens mulheres ao HIV/AIDS. Uma amostra de 500mulheres, com idades entre 15 a 24 anos, foram convidadas a participar por meio da técnica de amostragem com recrutamento dirigido pelo participante ou Respondent Driven Sampling (RDS) e a todas foi aplicado um questionário sócio-comportamental por meio de um computador de bolso. Adicionalmente, entrevistas semi-estruturadas com 24 jovens angolanas e14 namibianas e observações participantes foram conduzidas no lado angolano da fronteira.
Os resultados evidenciaram que há um conjunto imbricado de fatores estruturais (mudanças econômicas, crescente urbanização, processos de migração e mobilidade relacionados,representações e expectativas normativas de gênero e sexualidade, e processos de estigmatização e discriminação com base em gênero, nacionalidade, etnia e condição e posiçãosocioeconômica) que determinam oportunidades e a busca na formação de redes afetivo-sexuais e econômicas entre mulheres e a população masculina migrante, móvel e/ou autóctone,propiciando às jovens agregarem não apenas capital econômico, mas social e afetivo. Na formação e manutenção dessas redes, há claramente a presença da agência individual das mulheres que buscam acessar homens com maiores chances de lhes proporcionar a realização de seus projetos, desejos, e o acesso a recursos simbólicos e materiais; geralmente homens (vistoscomo namorados e/ou amigos ) mais velhos (diferenças de idade iguais ou maiores que 10 anos) e com melhor condição e posição socioeconômica. O engajamento nesses relacionamentostrazem riscos sociais (perda de reputação, sanções familiares, falta de suporte social, episódios de discriminação e violência) e sua gestão por parte das mulheres ganha precedência à gestão do risco de transmissão do HIV/AIDS por meio, por exemplo, do uso consistente de condom. Este se mostrou reduzido, inferior a 20 por cento, e foi mais utilizado no contexto do relacionamento com os amigos , parcerias ocasionais ou regulares cuja principal motivação das jovens para o relacionamento é a provisão de ajuda material / financeira, do que com os namorados.
Com estes, o não uso de condom parece estar menos vinculado à barganha pelo beneficio material e/ou financeiro recebido, como é mais com os amigos, fazendo parte de uma série de obrigações vinculadas às expectativas de reciprocidade baseada na confiança, amor e intimidade estabelecida, e moldadas por assimetrias de poder marcadas por gênero, idade e condiçãosocioeconômica. A permeabilidade e os processos de mobilidade e migração nessa região de fronteira, envolvendo mulheres, jovens e adultas, inseridas em redes afetivo-sexuais e econômicas transfronteiriças reitera a necessidade de esforços conjuntos e bilaterais noenfrentamento da epidemia de HIV na fronteira Angola-Namíbia que levem em consideração as iniquidades sociais e econômicas a que estão sujeitas. In Sub Saharan Africa, young women engaging in relationships with multiple partners in pursuit
of material/financial benefits, called 'transactional sex', have occupied a prominent place in
explanations of the regional HIV epidemic dynamics. However, studies are hindered by
conceptual and operational difficulties to define and identify such practices and analyze them in
relation to HIV/AIDS. They lack a perspective that includes both macro-structural aspects of the
context of women's lives and those at the micro-social level that can be observed in their
formation and maintenance of affective-sexual networks.
This thesis sought to understand the dynamics of affective and sexual relationships involving
economic exchanges and whether and how they could influence the vulnerability of young
women to HIV/AIDS. Conducted in a region of the international border between Angola and
Namibia, the methods included an epidemiological study with a qualitative research component.
A sample of 500 women, aged 15 to 24 years, was recruited through the Respondent Driven
Sampling (RDS) and a socio-behavioral questionnaire was given all through a pocket PC.
Additionally, semi-structured interviews with 24 Angolan young and 14 Namibian women and
participant observations were conducted on the Angolan side of the border.
The results showed that there is an overlapping set of structural factors (economic changes,
increased urbanization, migration processes and mobility, gender and sexuality norms, and
stigma and discrimination based on gender, nationality, ethnicity and socioeconomic position),
that determine opportunities and the formation affective-sexual and economic relations and
networks between women and migrant, mobile and/or indigenous men. The capital gained
through these relationships is not only economic but also social and affective. In the formation
and maintenance of these networks, the presence of individual agency of women is clear. They
seek men (seen as boyfriends/or 'friends') that tend to be older (age differences equal to or
greater than 10 years) that have a higher socioeconomic position and are able to provide them
with access to symbolic and material resources and means to realize their projects and dreams.
Engaging in these relationships bring social risks (loss of reputation, family sanctions, lack of
social support, episodes of discrimination and violence) and maintaining them takes priority
over managing the risk of infection of HIV/AIDS through, for example, consistent condom use.
Condom use was low (below 20%) and they were used more in the context of relationships with
'friends', occasional or regular partnerships where the main motivation of young people is
material/financial assistance, than with their boyfriends. In these relationships, the non-use of
condoms appears to be less tied to negotiations for material and/or financial support and more
related to expectations of reciprocity based on trust, love and intimacy shaped by asymmetries
of power marked by gender, age and socioeconomic status. The permeability and migratory
processes of women and girls involved in emotional-sexual and economic networks in this
border region is emblematic of the need for bilateral and joint efforts in combating the HIV
epidemic on the Angola-Namibia border that take into account the social and economic
inequities to which young women are exposed.