Dissertation
O uso de plantas medicinais na medicina popular praticada em assentamentos do MST do estado do Rio de Janeiro: uma contribuição para o SUS
The use of medicinal plants in folk medicine practiced in MST settlements in the state of Rio de Janeiro: a contribution to the SUS
Registro en:
RICARDO, Letícia Mendes. O uso de plantas medicinais na medicina popular praticada em assentamentos do MST do estado do Rio de Janeiro: uma contribuição para o SUS. 2011. 192 f. Dissertação (Mestrado em Saúde Pública) - Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2011.
Autor
Ricardo, Letícia Mendes
Resumen
No Brasil, as plantas medicinais vêm sendo utilizadas como recursos terapêuticos por grupos
sociais e em momentos históricos diferentes. Nas últimas décadas observou-se o
desenvolvimento de políticas, programas, regulamentos e recomendações sobre plantas
medicinais nas três esferas do governo brasileiro.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) agrega trabalhadores rurais de
origens diversas e os acampamentos, pré-assentamentos e assentamentos mantêm diferentes
relações com a rede pública de assistência à saúde. Além disso, o Setor de Saúde do
movimento incentiva o uso de plantas medicinais e introduz elementos de diferentes
racionalidades médicas nas áreas.
Nesse contexto, o objetivo geral da presente pesquisa é estudar a concepção do processo
saúde-doença-cuidado no uso de plantas medicinais pelos Agentes de Cura em assentamentos
do MST / RJ. Possibilita, dessa forma, compreender a utilização do Sistema Único de Saúde
(SUS) e de outros sistemas de cura pelos assentados.
Foi realizada uma pesquisa qualitativa que buscou promover o encontro de dois métodos –
Representações Sociais, segundo a Psicologia Social, e Educação Popular – com a finalidade
de compreender a Medicina Popular praticada em sua relação com a “situação-limite” vivida
pelos assentados do MST.
A Educação Popular como método de análise favorece a identificação de “palavrasgeradoras”, que nessa pesquisa têm um significado profundo para compreender os elementos
componentes da Medicina Popular.
Seis Agentes de Cura moradores de três áreas organizadas pelo MST / RJ foram entrevistados.
Utilizou-se entrevistas semi-estruturadas com roteiro-guia e observação participante.
O uso de plantas medicinais e a concepção do processo saúde-doença-cuidado foram descritos
e analisados a partir de características convergentes, divergentes e singulares apresentadas
pelos Agentes de Cura. Observou-se questões acerca de: colheita / coleta e processamento de
plantas medicinais, indicações e precauções, observação e experimentação própria, ampliação
do conhecimento, uso religioso de plantas medicinais, etiologia e diagnóstico, eficácia,
recursos e sistemas terapêuticos.
Muito embora seja polissêmica e heterogênea, elementos comuns observados nas práticas de
Medicina Popular baseada em plantas medicinais permitem caracterizá-la como um sistema
médico não formal, em disputa permanente, numa situação-limite.
Aspectos conflitantes entre a Medicina Popular e a Biomedicina evidenciam que a
convivência entre sistemas médicos não é harmônica, uma vez que estão em permanente
disputa pelo monopólio do cuidado. O conceito de “campo” desenvolvido por Pierre Bourdieu
foi utilizado a fim de compreender tal situação. Nota-se que a “unidade” conferida ao campo
da saúde é dada pelos demandantes, seus familiares e amigos, que ao perfazerem itinerários
terapêuticos se apropriam e conferem legitimidade aos diferentes sistemas médicos.
Nesse sentido, torna-se fundamental para a Saúde Pública buscar compreender as reflexões
dos diversos grupos sociais sobre o processo saúde-doença-cuidado e, mais especificamente,
sobre os usos dos recursos terapêuticos disponíveis, uma vez que isso influencia
consideravelmente as opções terapêuticas feitas. A mediação entre saberes é urgente e
delicada. Ampliar os espaços de diálogo entre profissionais e usuários de serviços, além de
articular os diferentes conhecimentos, torna-se essencial. In Brazil, medicinal plants are been used as therapeutics resources by various social groups in
different historical moments. In the past decades, the three Brazilian government spheres have
been developing several policies, programs, regulations and recommendations about
medicinal plants.
The Landless Workers‟ Movement (MST) join land workers from various origins and the
settlements, pre settlements and camps maintain different relations with the public health
system. Moreover, the movement‟s Health Sector stimulates the use of medicinal plants and
introduces elements from different medical rationalities.
In that context, the general objective of this research is to study the health-illness-care process
conception about the use of medicinal plants by Healer Agents in MST / RJ settlements.
Therefore, it makes possible to understand how is the utilization by the MST´s land workers
of the Brazilian Health System (SUS) and other healing systems. It was carried out a
qualitative research that associates two methods – Social Representations, according to the
Social Psychology, and Popular Education – in order to understand the Popular Medicine
practiced in its relation with the “borderline-situation” lived by the MST‟s land workers.
The Popular Education as an analysis method promotes the identification of “generativewords”, that have a particular purpose to comprehend the elements of Popular Medicine.
Six Healer Agents and inhabitants of three areas organized by MST / RJ were interviewed.
There were proceeded semi-structured interviews with a guide form and participant
observation.
The use of medicinal plants and the health-illness-care process conception were described and
analyzed from convergent, divergent and unique characteristics presented by the Healer
Agents. It was observed issues about: harvest / collect and medicinal plants processing,
precautions and indications, observation and own experimentation, knowledge transmission,
religious use of medicinal plants, etiology and diagnoses, efficacy, resources and therapeutical
systems.
Although the Popular Medicine has a polysemous and a heterogeneous quality, common
elements observed on its medicinal plants practices enable characterize it like a non formal
medical system, on a permanent dispute, at a borderline-situation.
Conflicting features between Popular Medicine and Biomedicine show that the relationship
between both systems is not harmonic, since they are on a permanent dispute for the care
monopoly. The concept of “field”, developed by Pierre Bourdieu, was used in order to
understand this situation. The unit conferred to the health field is given by the users, their
familiars and friends, who give legitimacy to different medical systems.
In this way, it is crucial to Public Health to attempt to understand the different socials groups
reflections about the health-illness-care process conception and, specifically, about the use of
therapeutics resources available because it influences considerably the therapeutical choices.
The mediation between knowledges is urgent and delicate. It becomes essential to increase the
dialogue between professionals and health services users, as well as to articulate the different
knowledges.