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A xawara e os mortos: os Yanomami, luto e luta na pandemia da Covid-19
The xawara and the dead: Yanomami people, mourning and fighting along COVID-19 pandemic
Registro en:
SILVA, Marcelo Moura; ESTELLITA-LINS, Carlos. A xawara e os mortos: os Yanomami, luto e luta na pandemia da Covid-19. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 267-285, jan./abr. 2021.
0104-7183
10.1590/S0104-71832021000100014
1806-9983
Autor
Silva, Marcelo Moura
Estellita-Lins, Carlos
Resumen
A partir de uma etnografia das primeiras repercussões da pandemia do coronavírus entre os Yanomami, apontamos cruzamentos e tensões entre concepções nativas sobre a morte e a origem das doenças e discursos da epidemiologia e da biossegurança, sobretudo na imposição do sepultamento biosseguro dos corpos dos Yanomami vítimas da Covid-19. Acompanhamos algumas traduções da pandemia feita pelos Yanomami, na Terra Indígena Yanomami, destacando a correlação entre a categoria nativa xawara e a história do contato com os napë (brancos), principalmente no modo como a chegada de uma nova doença reativa a memória das epidemias do passado e reelabora os perigos da proximidade com os brancos. Por fim, ao redor dos excessos patogênicos dos cadáveres, discute-se uma equivocação controlada envolvendo as insistentes permanências dos vírus e dos pore (alma-fantasma) dos mortos. Buscou-se reconhecer
os embates cosmopolíticos e a necessidade de traduções efetivas entre protocolos de biossegurança e a prática ritual dos funerais Yanomami, onde se mostra útil a adoção da hipótese do multinaturalismo para apresentar práticas compartilhadas na pandemia da Covid-19. Provided an ethnography attentive to the first repercussions of the coronavirus pandemic among the Yanomami, we pointed out tensions and cross-overs between native conceptions about the origin of diseases or death and epidemiology or biosafety discourses, especially due to imposing biosecurity corpse burial rules on Yanomami victims of COVID-19. We did follow some pandemic translation efforts by the Yanomami, in the Yanomami Indigenous Land, highlighting the correlation between the xawara and the history of napë (whites) contact, focusing especially the way through which new disease arrival reactivates memories of past epidemics and re-enacts dangers of close proximity to white people. Finally, around the pathogenic excesses of the corpses, a controlled equivocation involving the insistent permanence of viruses and the pores (ghost soul) of the dead was discussed. We sought to recognize cosmopolitical clashes and a claim for effective translations between biosecurity protocols and the ritual practice of Yanomami funerals. It proved useful to adopt the hypothesis of multinaturalism to discuss shared practices in COVID-19 pandemic.