Tese
Itinerários abortivos de mulheres: um recorte geográfico no estado da Bahia.
Fecha
2019-05-17Autor
Fonseca, Jamile Guerra
Institución
Resumen
A gravidez não planejada e o desfecho em aborto é realidade em todo o mundo. Países de leis
restritivas como o Brasil levam mulheres à construção clandestina de itinerários abortivos e as
expõem a risco, causando impacto na mortalidade materna. Esta pesquisa teve como
objetivos: Descrever a construção dos itinerários abortivos de mulheres em cidades da Bahia;
e analisar a experiência vivenciada por mulheres em itinerários abortivos, segundo a realidade
social em que estão inseridas. Trata-se de pesquisa qualitativa, desenvolvida em três
municípios de pequeno, médio e grande porte. Participaram da pesquisa 18 mulheres. O
material empírico foi produzido em 2017, por entrevista; cartas eletrônicas e aúdios via
whatsapp, os últimos sugeridos pelas mulheres. Foi utilizada a técnica de Bola de Neve para
acesso às mulheres, a partir da rede social informal da pesquisadora. O material empírico foi
analisado pela técnica de análise de discurso, utilizando gênero como categoria analítica. As
normas da Resolução 466/12 foram atendidas, e o projeto foi aprovado por Comitê de Ética
em Pesquisa, parecer número 2.161.994. Os resultados reafirmaram o aborto como problema
de saúde pública, revelaram disparidades sociais e de gênero e negação de direitos
reprodutivos. As reações à gravidez foram similares entre as mulheres dos três municípios
bem como os fatores que participaram da decisão pelo aborto: sociais, econômicos e culturais
diante de insegurança quanto à aceitação pela família e não apoio do parceiro. Buscaram
meios e métodos abortivos com amigas e/ou parceiro, conseguindo com erveiros, balconistas
de farmácias ou funcionários/as de hospitais. As ervas foram utilizadas nos três municípios, e
somente mulheres do município de grande porte buscaram clínicas particulares e casa de
aborteira. O cytotec foi utilizado com êxito, com pouca necessidade de finalizar o
abortamento em hospital. No município de médio porte, destacam-se métodos invasivos que
expuseram as mulheres a risco de morte. Nos serviços de saúde, a atenção se deu sob juízos
de valor, caracterizando violência obstétrica. Clínicas particulares ofereceram ações técnicas,
resolutivas, mas sem garantias de acolhimento da mulher. No período pós-aborto, houve
exacerbação de valores morais que geraram culpa, arrependimento, remorso e sofrimento na
maioria das mulheres dos três municípios. O parceiro presente em algumas situações quase
sempre desfez o relacionamento após o aborto, colocando a mulher em abandono afetivo. É
preciso que sejam efetivadas políticas de saúde na direção do planejamento reprodutivo, bem
como para evitar a recorrência de aborto; educação em saúde com problematização de
realidades e de desigualdades de gênero com jovens nas escolas e na rede de saúde com
usuárias, bem como elaboração de estratégias de cuidado pelas equipes de saúde, que
protejam as mulheres de danos físicos e emocionais. Sugerimos que o Ministério da Saúde
invista em capacitações profissionais, de modo a superar paradigmas que criminalizam o
aborto e revise leis com relação ao aborto no Brasil, na perspectiva de respeitar os direitos reprodutivos das mulheres e sua cidadania.