Dissertação (Mestrado)
Iniquidades na assistência pré-natal no Brasil: uma análise interseccional
Date
2021Author
Santos, Lorena Karol Ramos dos
Institutions
Abstract
As pesquisas epidemiológicas têm apontado injustiças na assistência pré-natal no Brasil, nas quais mulheres negras, indígenas, adolescentes, em pior condição socioeconômica e residentes nas regiões mais empobrecidas do país continuam recebendo cuidado aquém do preconizado. No entanto, esses trabalhos frequentemente não explicitam os referenciais teóricos que orientam suas análises e, assim, não aprofundam a discussão acerca dos processos sociohistóricos que tais iniquidades. A interseccionalidade enfatiza a sobreposição de sistemas de poder e opressão que estruturam a sociedade, e seus papéis na constituição de identidades sociais complexas e na emergência de iniquidades em saúde. Partindo dessa perspectiva e utilizando dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, investigamos o impacto do intercruzamento de raça/cor, escolaridade e local de residência na não adequação do cuidado prestado em diferentes dimensões da atenção pré-natal. Segundo a análise dos modelos de regressão logística múltipla, as variáveis operam em conjunto, mas não de forma interseccional, sobre a predição da não adequação pré-natal. A raça/cor e a escolaridade se somam na determinação da não realização de, pelo menos, 6 consultas e com seu início em até 12 semanas de gestação, estando as mulheres negras e as menos escolarizadas em situação de maior iniquidade. A não realização dos exames laboratoriais e físicos foi direta e significativamente determinada pelos efeitos aditivos da escolaridade, do local de residência e da faixa etária, com piores resultados para as mulheres de até 20 anos de idade, as residentes nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e as menos escolarizadas. Por último, o não recebimento da orientação para o parto esteve diretamente associado à raça/cor e à faixa etária; mulheres negras e as de até 20 anos de idade são mais propensas a não receberem tais orientações. Embora os resultados não revelem intersecções estatisticamente significativas, reiteram a natureza multifacetada do problema e alertam para a insuficiência dos inquéritos populacionais em contemplar realidades interseccionais, especialmente quando não incluem os segmentos mais marginalizados da população na amostra e não permitem sua caracterização mais detalhada. Abstract: Epidemiological research has pointed out injustices in prenatal care in Brazil, in which black women, indigenous people, adolescents, in worse socioeconomic conditions and living in the poorest regions of the country continue to receive care below the recommended level. However, these works often do not explain the theoretical references that guide their analysis and, thus, do not deepen the discussion about the socio-historical processes that such inequities. Intersectionality emphasizes the overlapping systems of power and oppression that structure society, and their roles in the constitution of complex social identities and the emergence of health inequities. Based on this perspective and using data from the 2013 National Health Survey, we investigated the impact of the interbreeding of race / color, education and place of residence on the inadequacy of the care provided in different dimensions of prenatal care. According to the analysis of the multiple logistic regression models, the variables operate together, but not intersectionally, on the prediction of prenatal non-adequacy. Race / color and schooling are added in determining the failure to perform at least 6 consultations and starting within 12 weeks of gestation, with black women and less educated women in a situation of greater inequity. Failure to perform laboratory and physical examinations was directly and significantly determined by the additive effects of schooling, place of residence and age group, with worse results for women up to 20 years of age, living in the North, Northeast and Center regions -West and the least educated. Finally, the failure to receive guidance for childbirth was directly associated with race / color and age group; black women and those up to 20 years of age are more likely to not receive such guidance. Although the results do not reveal statistically significant intersections, they reiterate the multifaceted nature of the problem and warn about the insufficiency of population surveys to contemplate intersectional realities, especially when they do not include the most marginalized segments of the population in the sample and do not allow their more detailed characterization.