Tesis
Tradução dos Cantares mexicanos: arqueologia de cinco cantos Nahua
Fecha
2021-08-17Registro en:
OLIVEIRA, Sara Lelis de. Tradução dos Cantares mexicanos: arqueologia de cinco cantos Nahua. 2021. 341. f., il. Tese (Doutorado em Literatura)—Universidade de Brasília, Brasília, 2021.
Autor
Oliveira, Sara Lelis de
Institución
Resumen
Esta tese consiste em dois discursos dos Cantares mexicanos, primeiro manuscrito do
volume MS 1628 bis conservado na Biblioteca Nacional do México, confeccionado após a conquista de
México-Tenochtitlan em 1521 para catequização de povos Nahua do e no Altiplano Central do México. O
primeiro discurso versa sobre o manuscrito, especificamente o conjunto de 24 cantos das folhas 16 verso
a 26 verso, com base na tradução inédita de cinco cantos [fls. 16v a 18v] do náhuatl clássico para o
português do Brasil. Segundo constatei mediante um processo de tradução sistematizado, contínuo e
reflexivo do referido corpus, possivelmente são cantos de origem pré-hispânica entoados na língua dos
Nahua em honra a governantes da Tríplice Aliança e a deuses e deusas cultuados pela elite Nahua, os
quais foram compilados e reescritos no chamado náhuatl clássico, provavelmente sob a supervisão do
missionário franciscano Bernardino de Sahagún, no âmbito do projeto colonial de destruição do sistema
religioso Nahua para imposição da religião católica. O resultado da reescrita foram cantos
transculturados, nesta tese adjetivados sob o vocábulo nepantla. Em náhuatl, refere-se a um advérbio
que significa ‘no meio, em meio, pelo meio’, utilizado metaforicamente por um nativo anônimo para
expressar sua experiência de transição ao catolicismo que o situava entre o panteão Nahua e o Deus
cristão. O advérbio deu origem a duas categorias —uma antropológica e outra linguística— denominadas
nepantlismo para caracterizar a transculturação como um dos efeitos da catequização. O referido corpus
dos Cantares denota o nepantlismo linguístico por constituir-se de fragmentos dos cantos tradicionais
interpolados por figuras católicas em espanhol, bem como por neologismos em náhuatl clássico para o
Deus cristão, característica textual através da qual entrevi a possibilidade de sugerir hipóteses para
possíveis forma e letras pré-hispânicas dos cantos por meio da tradução. Esse conhecimento sobre o
corpus dá origem ao segundo discurso, sobre a tradução dos cantos, o qual intitulei ‘arqueologia de cinco
cantos Nahua’. O aproveitamento dos cantos tradicionais para catequização norteia, hoje, para o texto
traduzido, tanto a recontextualização de possíveis elementos do ritual Nahua empobrecidos com a
escrita alfabética, quanto a reintegração de possíveis divindades Nahua substituídas, remetendo o
processo de tradução à investigação arqueológica de um locus linguístico em busca de uma possível
forma originária dos cantos tradicionais. O discurso sobre a tradução, por sua vez, trata das
possibilidades e dos limites da realização desse projeto tradutório levando em consideração que, nesta
tese, reconheceu-se e definiu-se o náhuatl clássico como uma língua colonizada, isto é, que não reflete
diretamente ou abarca integralmente a cosmovisão expressada na linguagem dos fragmentos dos cantos
Nahua pré-hispânicos. Como resultado, apresenta-se um texto traduzido que contrasta com o projeto
catequético e com traduções anteriores dos Cantares no exato quingentésimo ano da conquista de
México-Tenochtitlan ao privilegiar, na medida do possível, a performance e o panteão dos Nahua. Esta
pesquisa em tradução, nesse sentido, propõe uma interlocução diferenciada entre a tradução e os
estudos mesoamericanos, desde o referencial teórico da tradutologia, pois mostra os potenciais dessa
operação linguística na investigação da construção da cultura da elite Nahua no período colonial, bem
como na produção de conhecimentos sobre ela através da literatura em náhuatl clássico.