Tesis
Os donos da dívida
Autor
Ferreira, Alceu Conceição
Institución
Resumen
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política Esta pesquisa analisa a dívida pública interna brasileira a partir da posse dos títulos públicos. Ao contrário de outros estudos sobre o tema, buscou-se estudar o processo de financiamento da dívida pública, durante o governo FHC, de uma forma desagregada, ou seja, identificando o montante de cada título público que os principais detentores dessa dívida mantiveram em carteira naquele período, bem como os prazos de maturidade desses títulos. O estudo revelou que a dívida cresceu exponencialmente, está concentrada nas carteiras de um número reduzido de grandes bancos, é de curto prazo, pós-fixada e, os seus encargos estão absorvendo uma parcela significativa da receita pública, significando um processo de apropriação fiscal pelos bancos, cuja magnitude representa uma receita que, em muitos momentos, supera aquela oriunda da atividade tradicional dessas instituições - as operações de crédito. Essas variáveis podem se configurar em poder para os bancos, pois o governo depende deles para refinanciar a sua dívida e, portanto, pode ter as suas decisões estratégicas influenciadas ou constrangidas, caracterizando o exercício da hegemonia financeira por esses bancos. Contudo o poder dessas instituições não está relacionado somente ao controle de ativos financeiros, mas com outras dimensões de seu relacionamento com o Estado e também de sua própria organização de classe. Neste estudo analisamos as carteiras de títulos públicos dos dez maiores bancos por ativo total, segundo a classificação do jornal Valor Financeiro e, constatamos que, especialmente os bancos privados participam ativamente das associações de classe do setor e, portanto, do exercício de lobby que essas entidades executam junto aos poderes Legislativo e Executivo, ao mesmo tempo em que participam e se envolvem no processo político através do financiamento de campanhas de candidatos com projetos que tenham alguma sintonia com os seus objetivos empresariais. Desses indicadores, chama a atenção a composição da direção do Banco Central, constituída em parte por executivos, que antes ou depois de assumirem seus cargos, se vinculam diretamente às instituições financeiras privadas, incluídas aquelas referidas nesta pesquisa. Estes, na medida em que participam do Comitê de Política Monetária (COPOM), influenciam as decisões sobre a taxa básica de juros e, portanto, sobre a rentabilidade dos títulos públicos que as instituições financeiras controlam, o que, em outras palavras, significa que parte daqueles que decidem sobre a remuneração da dívida são ou estão vinculados aos próprios detentores da dívida pública. Nesse sentido, uma reflexão sobre o poder dos bancos não deve se restringir à quantidade de ativos financeiros que eles controlam, pois é a articulação de todos os indicadores mencionados que constitui o poder desses atores, ou melhor, que transforma o poder econômico em poder político, tornando possível que os banqueiros influenciem o processo decisório do governo com o objetivo de garantir segurança e alta rentabilidade para os seus ativos.