masterThesis
A vara, a vela e o remo: trabalho e trabalhadores nos rios e portos do Recife oitocentista
Autor
AROUCHA, Davi Costa
Institución
Resumen
Crescida entre ilhas estuarinas formadas pelo encontro dos rios Capibaribe e Beberibe com o mar, a cidade do Recife esteve desde cedo marcada por sua condição comercial e portuária. A forte presença dos rios e do porto como elementos definidores do espaço urbano local tornou essencial a existência de um ativo mundo do trabalho fluvial e portuário para a reprodução material de boa parte da vida social e econômica da cidade. Na primeira metade do século XIX, a partir de seu ancoradouro, o espaço urbano recifense consolidou uma posição de importante entreposto regional, responsável não só por articular a produção de açúcar e algodão do interior pernambucano com os mercados consumidores internacionais, mas também por intermediar, através da pequena cabotagem e da navegação fluvial, toda uma pequena rede de comércio de alimentos e bens de primeira necessidade entre vilas litorâneas e populações ribeirinhas das províncias de Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e sul do Ceará. As características físicas da hidrografia pernambucana e dos diversos portos litorâneos do litoral setentrional brasileiro impuseram, assim, grande importância e originalidade à cultura material desenvolvida entre os rios e estuários locais, conformando a predominância de três tipos específicos de embarcação: a canoa, a jangada e a barcaça. A bordo destas pequenas embarcações movia-se um universo social misto de trabalhadores, composto de escravos, libertos e homens livres pobres, que ainda tem sido pouco estudado pela historiografia pernambucana. Esta dissertação contém, assim, dois objetivos principais: em primeiro lugar, destacar os diversos papéis sociais e econômicos cumpridos pela pequena cabotagem e pelo pequeno transporte fluvial no Recife da primeira metade do século XIX; em segundo, analisar as experiências anônimas de vida e trabalho de canoeiros, jangadeiros e mestres-de-barcaça na conjuntura da sociedade escravista brasileira dos oitocentos. Na capital pernambucana, em especial, a centralidade histórica assumida pelos ofícios fluviais e portuários e a alta participação de homens negros e mestiços livres e libertos criaram brechas sociais que tornaram bastante fluídas as fronteiras entre escravidão e liberdade. Ao reconstituir uma parte destas histórias, o presente trabalho visa, assim, contribuir para os debates historiográficos relativos à transição da mão-de-obra escrava para a livre em Pernambuco e à própria história do trabalho fluvial, marítimo e portuário do Brasil. CNPq Developed between estuarine islands that were formed by the meeting of Capibaribe and Beberibe Rivers, the city of Recife was, since early, featured by its commercial and port conditions. The strong presence of those rivers and port as elements definers of the local urban space made essential the existence of an active world of fluvial and port work, for the material reproduction of a good part of social and economical life of the city. In the first half of the 19th century, from the port of Recife harbor, the city urban space has consolidated a position of important regional warehouse, responsible not only for articulate sugar and cotton production from the upstate of Pernambuco with the international consumers markets, but also for intermediate, through fluvial navigation and small cabotage, a small trade network of food and first needed goods between coastal villages and riverside populations from Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte and the south of Ceará. The physical characteristics of Pernambuco and northern Brazilian coastal ports hydrography imposed, then, great importance and originality for the material culture developed between local rivers and estuaries, conforming the predominance of three specific types of vessels: the canoe, the ‘jangada’ and the ‘barcaça’. On board of these small vessels there was a mixed social universe of workers, including slaves, freedman and poor free man, which still remains poorly studied by the historiography of Pernambuco. This dissertation contains, therefore, two main objectives: in first place, highlight the different social and economical roles fulfilled by the small cabotage and fluvial transport at Recife in the first half of 19th century; in second, to analyze the anonymous experiences of life and work of canoe and ‘jangada’ men and ‘barcaça’ masters at the conjuncture of Brazilian slaver society of the 19th century. At Pernambuco’s capital, specially, the historical centrality assumed by the fluvial and port works, and the great participation of black men, free half-breed and freedman created social gaps that turned fluid the frontiers between slavery and freedom. When reconstituting part of these histories, the present work aims, then, contribute for historiographical debates relative to the transition of slave manpower to free manpower in Pernambuco and the own history of fluvial, maritime and port work in Brazil.