Tesis
O cânone para os pequenos : a poesia de Hugo e Goethe em edições ilustradas para crianças brasileiras
Registro en:
LIMA, Lia Araujo Miranda de. O cânone para os pequenos: a poesia de Hugo e Goethe em edições ilustradas para crianças brasileiras. 2019. 281 f., il. Tese (Doutorado em Literatura) — Universidade de Brasília, 2019.
Autor
Lima, Lia Araujo Miranda de
Institución
Resumen
Alguns escritores consagrados pela crítica literária e pelo tempo deixaram marcas, ainda que
pontuais, na literatura infantil. Em edições ilustradas, esses textos, escritos originalmente ou
não para crianças, constituem uma forma peculiar de passagem de uma obra do estrato adulto
para o estrato infantil do sistema literário, que não se dá pelo tradicional procedimento de
adaptação da linguagem, mas por sua publicação em um formato que aponta para seu
direcionamento etário. Entram assim para o repertório da literatura infantil com a marca do
cânone. Quando traduzidos, esses textos podem migrar para o sistema literário de chegada em
suas edições originais, com a importação das ilustrações (quando há), ou podem ser
reilustrados no país de chegada. Nesta tese, examinamos poemas de Victor Hugo e Johann
Wolfgang von Goethe traduzidos em edições ilustradas para crianças, sob a perspectiva do
trânsito de obras entre literatura adulta e infantil, literatura nacional e traduzida, literatura
clássica e contemporânea. Dois dos poemas que compõem o corpus são de Victor Hugo. O
primeiro deles é “Jeanne était au pain sec dans le cabinet noir” (“A pão e água”), que faz
parte da obra Cantos para os meus netos, organizada e traduzida por Marie-Hélène Torres e
ilustrada por Laurent Cardon (Ed. Gaivota, 2014). O segundo, L'Ogre de Moscovie (O ogro
da Rússia), é um álbum ilustrado por Sacha Poliakova a partir do poema “Bon conseil aux
amants” (“Bom conselho aos amantes”), traduzido no Brasil por Eduardo Brandão (Ed.
Companhia das Letrinhas, 2012). Os outros dois poemas do corpus são de autoria de Goethe:
Der Zauberlehrling (O aprendiz de feiticeiro), traduzido por Mônica Rodrigues da Costa e
ilustrado por Nelson Cruz (Cosac Naify, 2006); e Das Hexen-Einmal-eins (A tabuada da
bruxa), extrato do Fausto traduzido por Jenny Klabin Segall em edição ilustrada por Wolf
Erlbruch (Cosac Naify, 2006). Essas obras têm em comum o fato de não consistirem em
adaptações assumidas para crianças, sugerindo um projeto tradutório (BERMAN, 1995) de
certo comprometimento formal e semântico com o texto fonte. Em termos de normas de
tradução, segundo a noção de norma inicial de Toury (1995), elas não se pretendem
primeiramente traduções aceitáveis, orientadas para o alvo, mas traduções adequadas,
tendentes à fonte. Tal escolha aponta para a dualidade de público (BECKETT, 2012;
SHAVIT, 1986): enquanto o estatuto canônico do autor evoca o adulto, as ilustrações apelam
para o leitor infantil. Os livros serão examinados em seus elementos textuais e paratextuais,
acrescentando à análise a contextualização das obras originais e de suas edições brasileiras, a
recepção das obras no Brasil, bem como o perfil de seus autores, ilustradores e tradutores. A
pesquisa tem como base a Teoria dos Polissistemas de Itamar Even-Zohar (1990), associada
ao ponto de vista histórico de Antonio Candido (2000), os Estudos Descritivos da Tradução e
os estudos sobre cânone. Orientam a análise crítica dos poemas os parâmetros delineados por
Shira Wolosky (2001) e Jean-Michel Adam (1985). Para a crítica das traduções, seguimos
uma abordagem textual, conforme Faleiros (2012) e Britto (2002, 2012), buscando avaliar a
coesão dos projetos tradutórios (BERMAN, 1995) e, a partir daí, em que medida as traduções
se sustentam como obra literária e são capazes de recuperar a materialidade dos textos fontes.
Com base nas análises, observamos e descrevemos aspectos do contato e das interferências
entre a literatura infantil e o cânone ocidental, por meio da tradução, com ênfase no seu papel
para a dinâmica e a evolução do sistema literário infantil.