Tesis
O traje de Oyá Igbalé como oferenda para adiar a morte : agenciamentos da coleção de trajes de candomblé da Casa Branca no Museu do Traje e do Têxtil
Fecha
2022-03-16Registro en:
QUEIROZ, Marijara Souza. O traje de Oyá Igbalé como oferenda para adiar a morte: agenciamentos da coleção de trajes de candomblé da Casa Branca no Museu do Traje e do Têxtil. 2021. 384 f., il. Tese (Doutorado em Artes Visuais) — Universidade de Brasília, Brasília, 2021.
Autor
Queiroz, Marijara Souza
Institución
Resumen
Esta pesquisa parte de análise empírica sobre a coleção de trajes de candomblé
consagrados ao orixá Oyá, na qualidade distintiva Igbalé, do Ilê Axé Yá Nassô Oká, Terreiro da
Casa Branca (Salvador, Bahia) doada ao Museu do Traje e do Textil (2007), vinculado à
Fundação Instituto Feminino da Bahia. Busca-se compreender a experiência social desse traje
a partir do agenciamento da coleção nos distintos sistemas simbólicos ou regimes discursivos:
do (re) uso religioso ao (des) uso museal. A coleção é formada por 81 peças, designadas camizu,
anágua, saia, ojá, pano da costa, bata, banté, pano de axé e adê (coroa), que fazem referência a
usos específicos no candomblé. Pertenceu a Georgeta Pereira de Araújo (1911 – 2004),
conhecida no Terreiro da Casa Branca como Mãe Nóla, Yá Dagã, título sacerdotal que
corresponde à terceira posição na hierarquia religiosa da Casa. Nóla Araújo, como é conhecida
na carreira de escritora, foi a primeira mulher branca a se iniciar no Candomblé da Casa Branca,
terreiro de mulheres negras, em 1943, período de transição do cenário intelectual brasileiro que
realçava a presença da África no Brasil, de modo a marcar novos delineamentos nas relações
de raça e gênero.
O museu agencia o processo de musealização e estabelece hierarquias entre os objetos
e coleções a partir de poderes hegemônicos socialmente pré-estabelecidos. O processo de
musealização decorre de um regime classificatório e narrativo/discursivo que atribui valores
desde a seleção à organização da informação e do conhecimento e suas formas de comunicação,
em especial a partir da exposição. Essa conduta tem contribuído para a invisibilização,
marginalização ou descaracterização de objetos e coleções de matrizes africanas, ao passo que
promovem silenciamentos e apagamentos da presença negra nos museus e espaços de arte. À
luz do pós-estruturalismo, consideramos que a musealização conta com agenciamentos
heterotópicos – técnicos e não técnicos; coletivos e individuais – que imputam olhares sobre a
classificação, manipulam discursos pelas linhas de fugas e pautam a diferença no debate através
do jogo da presença/ausência, desconstruindo e reconstruindo regimes discursivos.
Importa-nos pensar o trânsito do objeto – de religioso a museal – em suas experiências
sagradas e profanas, bem como os acréscimos ou subtrações informacionais decorrentes das
múltiplas possibilidades de leituras. Para além da artificação do processo religioso que envolve
a feitura do traje (materiais, técnicas e símbolos) e seu uso no ritual (mitos, corporalidade e
performatividade), esta análise assume abordagens múltiplas que contemplam o adensamento
de alteridades contra-hegemônicas para a construção de uma teoria e história da arte afro-
brasileira a partir do estudo de coleções. Conduzida pelo traje de Oyá Igbalé, objeto de campo
simbólico abstrato, abordamos teorias interseccionais e métodos transdisciplinares que
envolvem o campo filosófico, artístico, museológico, histórico e antropológico, com atenção
especial às epistemologias decoloniais e afro-diáspóricas que atravessam as Ciências Sociais e
Humanas na contemporaneidade.