Tesis
E a Jurema se abriu toda em flor… : a luta por reconhecimento do Povo de Jurema como povo tradicional de matriz Afro-indígena
Fecha
2019-02-21Registro en:
MIRANDA, Carla. E a Jurema se abriu toda em flor…: a luta por reconhecimento do Povo de Jurema como povo tradicional de matriz Afro-indígena. 2018. 225 f., il. Tese (Doutorado em Direito)—Universidade de Brasília, Brasília, 2018.
Autor
Miranda, Carla
Institución
Resumen
Esta tese analisa o fenômeno de visibilidade recente da Jurema Sagrada, que emerge nos
últimos 10 anos como uma religião autônoma dentre as outras religiões afro-brasileiras.
Nossa tese é que esta visibilidade se dá no campo do direito, ou seja, estamos diante de um
novo sujeito coletivo de direito em sua luta por reconhecimento. Este sujeito autonominado
como “Povo de Jurema” está em movimento na arena jurídica e criando direitos.
Compreendemos o direito, a partir de Lyra Filho, como processo de luta dos grupos sociais
no espaço público, portanto, um sistema aberto e em transformação. Por isso torna-se
necessário compreender a dinâmica da relação deste grupo com outros grupos sociais e
com o Estado para demostrar como se constitui este sujeito coletivo e que direitos ele está
criando. Para tanto investigamos no primeiro capítulo a tessitura das relações sociais
históricas entre a Jurema e outras religiões afro-brasileiras. Pudemos observar que a
presença da Jurema dentre as religiões afro-brasileiras está diretamente ligada ao modelo
de oficialização e legalização destas religiões, e ainda, que este modelo de legalização
também alterou a relação destas religiões com a Jurema. Seguindo estas conclusões
identificamos a necessidade de investigar a relação mais recente dos grupos praticantes das
religiões afro-brasileiras com o Estado. Refazemos portanto, no segundo capítulo, os
caminhos percorridos por este grupo populacional na conquista de espaços institucionais,
desde a primeira inciativa de reconhecimento que se deu pela patrimonialização da Casa
Branca do Engenho Velho até o acesso pontual a direitos por via das políticas de promoção
da igualdade racial e política de combate às desigualdades sociais. Analisando estes
espaços conquistados identificamos a transição das categorias de nominação deste grupo
populacional, de religiões afro-brasileiras para povos de terreiro. No terceiro capítulo
seguimos este percurso analisando a constituição da política de reconhecimento específica
para os povos de terreiro, a qual estabelece a nominação “povos e comunidades
tradicionais de matriz africana” como categoria atual de diálogo destes grupos com o
Estado. É tendo o conhecimento deste contexto que apresentamos no quarto capítulo as
ações de visibilidade da Jurema. Identificamos que a visibilidade da Jurema se dá através
da presença dos juremeiros no espaço público e portanto tomamos como situação
etnográfica para nossa análise três importantes eventos realizados pelos juremeiros nos
quais participamos como observadores: o “IX Kipupa Malunguinho - Coco na Mata do
Catucá”, a “IV Caminhada dos Terreiros do Estado de Pernambuco”, e o “III Encontro de
Juremeiros e Juremeiras em Alhandra”. Entendendo as festas e eventos como
condensações de um fenômeno e, identificando a potencialidade do instrumental analítico
de rituais de Stanley Tambiah, tomamos estes eventos como performances do grupo social
na sua luta por reconhecimento e criação de direitos. No último capítulo analisamos as
performances apresentadas em termos de formação de uma identidade coletiva, analisamos
as construções discursivas que caracterizam a identidade “Povo de Jurema” como étnica e
religiosa, e por fim, analisamos como esse sujeito coletivo está criando direitos ao
mobilizar discursos e reelaborar categorias do repertório da política de reconhecimento dos
povos de terreiro. Concluímos que a emergência contemporânea da Jurema não é uma
simples diferenciação das outras religiões de matriz africana. Nas ações públicas os
juremeiros constituem-se como sujeito coletivo e se expressam através da identidade “Povo de Jurema”. É através dessa identidade que o sujeito coletivo reformula
democraticamente o direito, quando impulsiona a transformação da categoria de
reconhecimento dos povos de terreiro para “Povos Tradicionais de Matriz Afro-Indígena”.
Podemos ver desta perspectiva a agência do Povo de Jurema na construção do direito. Os
juremeiros conquistam seu espaço de cidadania e ao mesmo tempo ampliam e atualizam o
direito dos povos de terreiro.